terça-feira, 13 de outubro de 2009

Sobre laranjas e mentiras.

Em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, o economista e líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, João Pedro Stédile fala sobre a ocupação de um laranjal de propriedade questionada, mas dada pela grande mídia como pertecenente ao grupo Cutrale, bem como da manobra que tenta criar uma CPI já derrotada no Congresso, comissão que segundo ele, tem conotações eleitoreiras.
Chamo a atenção para o formato das questões formuladas pelo empregado da Folha, em especial à primeira, que inicia por um clássico "Independentemente da situação da propriedade", ou seja, "Independentemente do fato, vamos às nossas conjecturas"...
Copiei essa entrevista do sítio Vermelho:
João Pedro Stedile fala em entrevista sobre caso do laranjal
João Pedro Stedile, 55, da direção nacional do MST, afirma que o movimento não perdeu o foco, que condena todo o tipo de "vandalismo" e que o presidente Lula está "mal informado", numa referência à declaração do petista na qual chamou exatamente de "vandalismo" a ação do movimento numa área de plantação de laranja no interior de São Paulo. Em entrevista à Folha Stedile minimiza a derrubada dos pés de laranja na área da Cutrale, pois, segundo ele, a produção seria destinada à exportação, e não para a mesa dos brasileiros.

FOLHA - Independentemente da situação da propriedade [o Incra diz que está ocupada de forma irregular, o que é negado pela empresa], a ação chama a atenção pela destruição deliberada de alimentos. Foi um erro destruir aqueles pés de laranja? JOÃO PEDRO STEDILE - O fato de a área ser grilada, confirmado pelo Incra, não é algo secundário. Esse é o fato. Um dos princípios que o MST respeita é a autonomia das famílias de nossa base. A distância, a população pode achar que derrubar pés de laranja foi uma atitude desnecessária. A direita, por meio do serviço de inteligência da PM, soube utilizar [as imagens] contra a reforma agrária, se articulando com emissoras de TV para usá-las insistentemente. Nunca essas emissoras denunciaram a grilagem nem a superexploração que a Cutrale impõe aos agricultores.

FOLHA - Ao destruir alimentos, o MST não teme perder o apoio das camadas mais pobres da população, como das 12 milhões de famílias que dependem do Bolsa Família para comprar sua própria comida? STEDILE - Cerca de 98% da produção de suco no pais é exportada. Esse suco não vai para a mesa dos pobres, com ou sem Bolsa Família. Já o nosso modelo para a agricultura brasileira quer assegurar produção de alimentos, a geração de emprego e renda no meio rural. Queremos produzir comida e, inclusive, suco de laranja para chegar à mesa de todo o povo brasileiro. Não para o mercado externo. Mesmo assim, a área de exploração da laranja [no país] diminuiu em 400 mil hectares nesses dez anos, pela exploração que a Cutrale impõe aos agricultores.

FOLHA - O presidente Lula chamou a ação de "vandalismo". O MST ainda o enxerga como aliado? STEDILE - Nós também condenamos o vandalismo. Usar 713 milhões de litros de venenos agrícolas por ano, que degradam o meio ambiente, também é vandalismo. Nesse caso, o presidente está mal informado, pois as famílias acampadas nos disseram que não roubaram, não depredaram nada. Depois da saída deles e antes da entrada da imprensa, o ambiente foi preparado para produzir imagens de impacto. Propomos que uma comissão independente investigue a verdade.

FOLHA - É correto hoje dizer que a conjuntura nacional, principalmente de estabilidade econômica e de assistência oficial aos pobres do país, é desfavorável ao MST? STEDILE - Os dados do censo [agropecuário] revelam que menos de 15 mil latifundiários são donos de mais de 98 milhões de hectares. A renda média dos assalariados do campo é menor que um salário mínimo. Diante disso, reafirmamos que é fundamental democratizar a propriedade da terra, como manda a Constituição, e mudar o modelo agrícola, para priorizar a produção de alimentos sadios para o mercado interno. Quem acha que a reforma agrária não é necessária está completamente alheio aos problemas e aos interesses do povo.

FOLHA - Essa conjuntura deixa o MST sem foco? STEDILE - Ao contrário. Nunca foram tão necessárias essas mudanças. Bancos e empresas transnacionais controlam a agricultura. E, quando ocupamos uma terra para pressionar a aplicação da reforma agrária, enfrentamos todo esses interesses. O Brasil precisa de um projeto que combata as causas da desigualdade social e garanta o acesso a terra, educação, moradia e saúde a todos, e não apenas a uma minoria.

FOLHA - Algum nome para as eleições de 2010 anima o movimento? STEDILE - O MST preserva sua autonomia. Nossos militantes participam das eleições como qualquer cidadão. Infelizmente, cada vez que chega o período eleitoral, a direita se assanha para enquadrar as candidaturas contra o MST e a reforma agrária. Esse pedido de CPI tem apenas motivação eleitoral. O [deputado Ronaldo] Caiado [líder do DEM na Câmara] confessou que o objetivo da CPI é provar que o governo repassa dinheiro para o MST fazer campanha para a Dilma [Rousseff], o que é ridículo.

Publicado na Folha de S. Paulo de 12/10/2009

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